Santo Big Data! Ainda que possa existir muita divergência sobre o que vem a ser este tema, seu ineditismo ou relevância, o barulho em torno do Big Data definitivamente serviu para enfatizar a importância para empresas do uso de “inteligência” para que empresas possam se manter competitivas, o que é ótimo para empresas, como a nossa, que vivem de fornecer inteligência para outras. A ideia básica não é nova, é claro. Há décadas sabemos da importância de basear certas decisões empresariais em informações quantitativas, sejam estas informações capturadas primariamente, ou geradas por análises de dados secundários ou internos da empresa. O que mudou com o Big Data, na minha opinião, tem mais a ver com “intensidade” que com a “natureza” do fenômeno. Porém há novidades sim que merecem ser destacadas.
A mudança mais importante para mim ocorre no dia a dia das pessoas. Nunca antes neste mundo geramos tantos registros sobre o que fazemos, pensamos, sentimos ou desejamos, como hoje. Não é exagero dizer que a humanidade vive o maior nível de “registrificação” (se existisse essa palavra) de sua história. Não vou cansar inutilmente o leitor acostumado a ouvir os exemplos de como estamos conectados e digitalizados, pois estes são repetidos por quase todos que escrevem sobre este tema. Mas proponho uma breve reflexão sugerindo que cada um pergunte a si mesmo, agora, neste instante, quais são os registros gerados sobre sua atividade, localização ou preferência. Refiro-me, naturalmente, de registro digitais, a maioria deles gerados no espaço das nuvens virtuais, e, portanto, potencialmente acessíveis por outros. A tendência é, todos sabem, que a produção destes registros digitais pessoais – e institucionais – continue aumentando nos próximos anos. Falamos hoje da internet das coisas, o que potencialmente colocará em frenética comunicação não somente nossos dispositivos pessoais, mas o restante das “coisas” com que interagimos. Parte fundamental do apelo do Big Data como fonte de inteligência para empresas, está associado à possibilidade de usarmos estas informações na descoberta de padrões comportamentais de consumidores ou demais fatores do processo mercadológico. Para quem acredita em dados e sabe como utilizá-los, é uma promessa tentadora, não resta dúvida.
O Big Data também traz novidades na tecnologia para armazenar e processar estes dados. O aumento em volume e complexidade nas massas de dados gerados cotidianamente poderá ser absorvido graças as novas tecnologias para gestão de dados não estruturados. Resumindo grosseiramente a ópera: existem hoje plataformas para processar e administrar bancos de dados que dão conta de massas de dados gigantescas e aparentemente pouco organizadas, numa velocidade impressionante. Nos faz acreditar que agora é finalmente possível usar dados complexos para decisões complexas em tempo real, uma mágica que já vem sendo prometido há décadas, mas até o momento não parecia tão possível.
Ok, então volumes de dados que tendem ao infinito processados por ferramentas milagrosas resultam no milagre do Big Data. Suficiente para que tenhamos esperança de profundas mudanças, mas também mais que suficiente para que os mais entusiasmados anunciem a mudança dos tempos. Pessoalmente, não penso que é para tanto. Um mito que vem comumente sendo ventilado é que o Big Data é a universalização da informação. Ou seja, se disponibilizará tanto dado, para tanta coisa, que não precisaremos de estimar nada. Apenas observar. Segundo esta visão, contado são os dias dos estatísticos, demógrafos ou econometristas que se esmeram em desenvolver formas analíticas para interpretar a realidade através dos dados. No mundo do Big Data, a resposta sempre estará disponível, na imensidão dos dados. Não acredito por um minuto que isso ocorrerá um dia. Acho que tal fantasia somente pode passar pela cabeça de quem pouco trabalhou com dados e, portanto, não reconhece as intrínsecas dificuldades em tirar destes qualquer valor objetivo. Não vou me estender, mas alguns dos dilemas comuns em processos de leitura de dados com o propósito de aprender com estes incluem problemas na interpretação de causalidade ou endogeneidade dos mesmos. Sinto, mas, ainda que possamos aumentar o tempo de voo no automático, não será possível dispensar o piloto!
Outro aspecto ainda obscuro da promessa revolucionaria do BD se refere ao acesso a estas informações. Atualmente, poucas empresas de fato têm condições de usar volumes de dados tão impressionantes. Em geral, somente aqueles que geram experiências de impacto universal como o Google e derivados (Waze, Linkedin, etc.), Facebook, Microsoft, e similares, podem dizer que de fato podem se beneficiar com o milagre do Big Data. É claro que há uma tendência generalizada de usarmos mais dados, em volumes e velocidade cada vez maiores, mas não acho que isso somente é suficiente para se chamar de “game changer”. Se existe por um lado a possibilidade de crescer nos próximos anos a proliferação na forma de coleta de dados por empresas, há por outro lado a inevitabilidade do aumento da consciência das pessoas geradoras de dados sobre ganhos e perdas com a perda de privacidade. E cedo para dizer onde será feito o corte, mas é certo que este tema se desenrolará em muitos novos capítulos. O provável é que encontremos um equilíbrio entre o desejo por privacidade e conveniência que represente as preferências das pessoas. Mas até lá muita água rolará por baixo desta ponte.
Por fim, vale ressaltar o potencial do Big Data para amantes do geoprocessamento. De modo geral, quase todo registro digital tem um “endereço” físico, as vezes mais relevante (por exemplo, a localização por GPS de um consumidor), as vezes menos (a localização física do endereço IP de um servidor). O fato é que a tecnologia de geoprocessamento também está ajudando a mudar o mundo, e poucos tem se dado conta disso. Mapas e muito dados, e analistas e tecnologias inteligentes para gerar mais inteligência e conveniência. Esta é a toada do momento. Quer chamar de Big Data? Por que não?
Fonte: Canaltech
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